MLS - Educational Research (MLSER)

http://mlsjournals.com/ Educational-Research-Journal

ISSN: 2603-5820

Cómo citar este artículo:

Sanz-Peinado, R. (2023). Gestão escolar demotrática e qualidade social da educação. MLS Inclusion and Society JournaL , 3(2), 119-137. 10.56047/2491/mlsisj.v3i2.2519

GESTÃO ESCOLAR DEMOCRÁTICA E QUALIDADE SOCIAL DA EDUCAÇÃO

Stefany de Barros Camargo
Universidade Puc-Goiás (Brasil)
stefayCamargo@hotmail.com · https://orcid.org/0009-0007-0719-2809

Leticia Barros Camargo
Universidade Puc-Goiás (Brasil)
leticiaaieska@hotmail.com · https://orcid.org/0009-0000-8866-6488

Fecha de recepción: 02/12/2023 / Fecha de revisión: 10/12/2023 / Fecha de aceptación: 18/12/2023

Resumo: O presente artigo examina as tensões entre perspectivas gerencialistas e democráticas nas políticas educacionais brasileiras contemporâneas, evidenciando contradições entre discursos e práticas. Embora documentos orientadores como LDB e PNE veiculem ideais emancipatórios e inclusivos para a educação, programas governamentais têm enfatizado accountability, resultados quantitativos e lógicas de mercado. Concomitantemente, medidas de austeridade como a EC 95 estrangulam na prática qualquer possibilidade de efetivação dos princípios progressistas previstos na legislação. Esse tensionamento revela disputas mais amplas na arena política, com setores comprometidos com a mercantilização do ensino confrontando historicamente as lutas por uma escola pública, gratuita e de qualidade para todos. Urge reinventar o papel do Estado para além da regulação, resgatando seu protagonismo como provedor e mantenedor de condições materiais à efetivação do direito à educação.Tal reinvenção passa pela mobilização coletiva pela construção de processos educativos contextualizados, emancipadores e contrários ao aligeiramento curricular. Requer escolas geridas democraticamente, com participação popular nas decisões pedagógicas e uso dos recursos. Reivindica-se assim uma política educacional fiel aos interesses das maiorias, superando a agenda privatista e gerencialista que solapa seus potenciais democratizantes. A universalização do padrão de qualidade como direito demanda essa escola pública reinventada e comprometida ethicamente com nossa gente

keywords: Estado, neoliberalismo, qualidade, qualidade, gestão escolar


DEMOCRATIC SCHOOL MANAGEMENT AND THE SOCIAL QUALITY OF EDUCATION

Abstract: This article examines the tensions between managerialist and democratic perspectives in contemporary Brazilian education policies, highlighting contradictions between discourse and practice. Although guiding documents such as the LDB and PNE convey emancipatory and inclusive ideals for education, government programs have emphasized accountability, quantitative results and market logics. At the same time, austerity measures such as EC 95 strangle in practice any possibility of implementing the progressive principles laid down in the legislation. This tension reveals broader disputes in the political arena, with sectors committed to the commercialization of education historically confronting the struggles for a public, free and quality school for all. There is an urgent need to reinvent the role of the state beyond regulation, reclaiming its leading role as provider and maintainer of the material conditions for the realization of the right to education.This reinvention involves collective mobilization to build educational processes that are contextualized, emancipatory and opposed to curricular lightening. It requires democratically run schools, with popular participation in pedagogical decisions and the use of resources. This demands an educational policy that is faithful to the interests of the majority, overcoming the privatist and managerialist agenda that undermines its democratizing potential. The universalization of quality standards as a right demands this reinvented public school, ethically committed to our people.

keywords: State, neoliberalism, quality, education, school management


Introducción

A relação entre Estado, políticas educacionais e qualidade da educação tem sido exaustivamente debatida por diversos pensadores e estudiosos da educação na contemporaneidade, ganhando ainda mais centralidade nos últimos anos (Azevedo, 2017; Silva, 2020; Santos, 2021; Vieira, 2022). De acordo com Azevedo (2017), o Estado desempenha um papel crucial na efetivação do direito humano e social à educação, cabendo a essa instância a universalização do acesso educacional por meio do financiamento e provisão pública de sistemas educativos. Além de regulamentar parâmetros e diretrizes para a política educacional, ao Estado também compete executar essa política de modo a garantir oportunidades educacionais para todos, especialmente para grupos historicamente excluídos, buscando equidade e justiça social (Silva, 2020).

 

Conforme analisado por Santos (2021), a efetivação do direito à educação e a oferta de ensino de qualidade estão intrinsicamente relacionados à capacidade dos Estados em formular e implementar políticas públicas educacionais consistentes e bem financiadas. Nesse sentido, é papel primordial dos governos assegurar os recursos orçamentários necessários para financiar planos, programas e ações que promovam melhorias tangíveis na qualidade da aprendizagem e alavanquem a equidade no campo educacional.

 

Entretanto, de acordo com Vieira (2022), há desafios históricos e estruturais que dificultam a universalização de uma educação pública gratuita, inclusiva e transformadora no Brasil. As desigualdades educacionais e sociais ainda são profundas, com impactos significativos nos resultados de aprendizagem da maioria dos estudantes brasileiros. Isso because os investimentos do Estado na educação são aquém do ideal para um país com as dimensões continentais e contrastes socioeconômicos do Brasil. Portanto, ampliar o financiamento da educação e formular políticas consistentes de valorização e formação docente são passos indispensáveis para alavancar a qualidade da educação pública no longo prazo.

 

Assim, na visão desse autor, uma educação de qualidade social somente pode ser alcançada quando o ente estatal assume suas responsabilidades de expandir o atendimento escolar, eliminar barreiras de acesso e permanência e prover condições materiais e pedagógicas adequadas e inclusivas para que todos os estudantes desenvolvam seu máximo potencial, em uma perspectiva de educação emancipadora. Portanto, a garantia do direito à educação perpassa tanto o papel regulador e financiador do Estado, como também sua atuação executora na implementação de políticas educativas universalistas e voltadas à equidade e justiça social.

 

Contudo, em contraposição a essa visão do Estado provedor e executor de políticas educacionais inclusivas, nas últimas décadas testemunhamos o avanço de reformas neoliberais que reconfiguram seu papel no campo da educação. Como examinado por pensadores críticos como Gentili (2020), Peroni (2020), Apple (2017), Ball (2014), Lipman (2011) e Torres (2013), tais reformas têm reduzido a função do Estado à regulação, avaliação e controle dos sistemas educativos, transferindo a execução concreta dos processos educacionais para a iniciativa privada ou para instâncias locais de gestão.

 

De acordo com Apple (2017), essas reformas representam uma agenda política e econômica que visa encolher o Estado e abrir novos nichos de acumulação de capital no campo educacional. Ball (2014) complementa essa visão ao evidenciar como princípios e práticas oriundos do setor empresarial têm colonizado os sistemas públicos de ensino, redesenhando processos, relações e subjetividades nos contextos escolares.

 

Em consonância, Lipman (2011) e Torres (2013) analisam como essas políticas neoliberais vêm redesenhando as redes escolares públicas e reconfigurando as relações entre Estado, mercado e sociedade civil nos últimos anos. Promove-se uma lógica gerencialista, pautada pela racionalidade econômica, accountability e busca de lucratividade, que mina os propósitos redistributivos e equalizadores das políticas educacionais, historicamente vinculados aos ideários de justiça social e direitos humanos.

 

Portanto, diante da ascensão dessas reformas, os autores destacam a importância de compreender seus impactos concretos nos processos de ensino-aprendizagem, no trabalho docente, no currículo e avaliação escolar, bem como nas desigualdades educacionais. Em vista desses efeitos, faz-se necessário fortalecer as lutas políticas e sociais em defesa da educação pública e de qualidade para todos.

 

Sob a lógica gerencialista, que trata a educação como um serviço não exclusivo do Estado, os governos assumiram um caráter avaliador, delineando políticas e parâmetros a serem cumpridos por prestadores educacionais públicos não-estatais ou privados (Apple, 2006; Ball, 2014; Dale, 2004; Robertson, 2012; Shoen & Fusarelli, 2008). Essa tendência representa não somente uma diminuição do Estado, mas também o esvaziamento de seu compromisso público e social com o desenvolvimento integral dos estudantes e a redução das profundas desigualdades educacionais existentes, em prol de interesses econômicos e mercantis.

 

De acordo com Apple (2006), a adoção de políticas gerencialistas na educação abre espaço para que grupos econômicos lucrem com a mercantilização do ensino, redesenhando currículos, processos avaliativos e a formação de professores de acordo com seus interesses. Ball (2014) complementa essa visão, destacando como a accountability educacional serve para controlar e moldar o trabalho docente, minando sua autonomia profissional. 

 

Para Dale (2004) e Robertson (2012), essa lógica gerencialista promove a competitividade entre escolas e redes de ensino,bem como incentiva a sua gestão por resultados mensuráveis, o que nem sempre condiz com processos formativos significativos e inclusivos. Shoen e Fusarelli (2008) também analisam como essas políticas enfraquecem o compromisso do Estado com uma educação pública, laica e de qualidade para todos.

 

Portanto, faz-se necessário problematizar os impactos dessas reformas gerencialistas nos sistemas educativos e fortalecer os movimentos sociais que lutam por uma educação emancipadora, crítica, democrática e socialmente referenciada. É papel da sociedade civil exigir e defender um Estado comprometido com o bem público educacional.

 

Nesse cenário de transferência de responsabilidade estatal para outros entes da sociedade civil ou do mercado, a crítica de intelectuais como Gentili, Peroni, McLaren (2005), Siniscalco (2002), Tommasi (2007), Shiroma (2011) e Libâneo (2012) recai justamente sobre a perda do ideário de uma educação gratuita, democrática e de qualidade para emancipação dos indivíduos, em favor de uma lógica gerencialista focalizada em resultados e auferição de lucros na prestação educacional. 

 

De acordo com McLaren (2005), o avanço do capitalismo global e das políticas neoliberais está redesenhando os propósitos da escolarização, transformando-a em mais um nicho de acumulação privada em detrimento de seu papel histórico de formação de sujeitos críticos. Nessa mesma linha, Siniscalco (2002) e Tommasi (2007) analisam como a mercantilização educacional solapa o compromisso dos Estados com o financiamento público da educação, especialmente nos países periféricos.

 

Shiroma (2011) e Libâneo (2012) também destacam os riscos da adoção acrítica de políticas gerencialistas nos sistemas de ensino público, as quais minam a autonomia profissional, o protagonismo dos educadores e os vínculos escola-comunidade em prol de uma accountability vertical e resultados quantificáveis. Desse modo, o processo de mercantilização e privatização em curso descaracteriza o compromisso histórico do Estado com um projeto publicamente financiado de educação integral e transformadora.

 

Portanto, é papel fundamental dos movimentos sociais e sindicatos docentes fortalecer as lutas em defesa da educação pública de qualidade, gratuita, laica e socialmente referenciada. Exige-se uma retomada do compromisso dos Estados nacionais com o financiamento e materialização do direito à educação.

 

Nessa perspectiva, a própria concepção de qualidade educacional assume contornos distintos à luz de diferentes projetos político-pedagógicos. De um lado, no bojo das reformas neoliberais, ganha força o paradigma empresarial da Qualidade Total na educação, abordado originalmente por autores como Ramos (1992), Bonamino (2002), Oliveira e Araujo (2005), Sordi e Ludke (2009) e Aguiar (2001) e amplamente difundido nas últimas décadas. 

 

Sob essa ótica gerencialista, priorizam-se os resultados mensuráveis, a eficiência de processos e produtos educativos e a eficácia da escolarização para preparação dos indivíduos para o mercado produtivo, conforme analisado por Oliveira e Araujo (2005). Bonamino (2002) também destaca como esse paradigma enfatiza os processos de avaliação externa e ranqueamento de escolas e redes de ensino com base em seus desempenhos em exames padronizados, fortalecendo uma cultura de performatividade e accountability nos sistemas educativos.

 

Em contraposição, Sordi e Ludke (2009) e Aguiar (2001) ressaltam a necessidade de referenciais alternativos de qualidade educacional, comprometidos com a formação humana integral, emancipação e inclusão social. Defendem, pois, uma concepção de qualidade socialmente referenciada, que considere as singularidades dos contextos escolares, as condições concretas de ensino-aprendizagem e os projetos coletivos das comunidades atendidas pelas escolas públicas.

 

Portanto, no cerne dos debates contemporâneos sobre políticas educacionais, evidenciam-se distintas noções de qualidade e de papel do Estado que expressam interesses antagônicos sobre os propósitos da educação escolar na sociedade. Cabe à sociedade civil participar ativamente dessas disputas em prol de um sistema educacional público, democrático e de qualidade social para todos.

 

Em contraposição, uma vertente crítica, representada por estudiosos como Gentili (2020), Demo (2018), Saviani (2011), Frigotto (2010), Shiroma (2007), Paro (2016) e Libâneo (2012), contrapõe a esse enfoque uma visão de qualidade social que se vincula aos ideais democráticos de emancipação humana. 

 

Essa perspectiva relaciona qualidade à participação efetiva da comunidade na gestão escolar, à formação integral do sujeito para o exercício da cidadania plena e à função igualadora da educação no combate às históricas desigualdades educacionais e sociais ainda no nosso meio, conforme analisado por Saviani (2011) e Shiroma (2007).

 

Além disso, Frigotto (2010) e Libâneo (2012) destacam a importância de se conceber a qualidade da educação de forma multidimensional, englobando não somente o desempenho acadêmico dos estudantes, mas também as condições materiais das escolas, a formação e valorização dos professores e o projeto político-pedagógico assumido pelas comunidades escolares.

 

Paro (2016) complementa essa abordagem salientando que a qualidade deve ser definida no âmbito das escolas e seus atores, de modo democrático e participativo, e não simplesmente imposta de cima por políticas homogeneizantes. Assim, ressalta-se uma visão de qualidade negociada, que considere os anseios, demandas e visões de mundo das comunidades atendidas pelas instituições de ensino.

 

Portanto, no bojo dos embates político-ideológicos da contemporaneidade, distintas noções de qualidade educacional refletem projetos societários e concepções sobre o papel da educação na sociedade muitas vezes antagônicos. Cabe aos educadores e movimentos sociais fortalecer uma perspectiva crítica e transformadora nos debates sobre políticas públicas educacionais.

 

Portanto, enquanto o enfoque da Qualidade Total prioriza resultados quantitativos e preparo para o trabalho subordinado, um olhar de qualidade social volta-se ao desenvolvimento multidimensional dos estudantes, à superação de barreiras de acesso e permanência na escola e à formação de sujeitos críticos e participantes, comprometida com a democratização da sociedade brasileira (Gentili, 2020; Saviani, 2011; Shiroma, 2011; Paro, 2016; Sordi & Ludke, 2009). 

 

Essa tensão entre lógicas mercadológicas e perspectivas crítico-emancipatórias atravessa o debate contemporâneo sobre qualidade da educação pública em tempos de Estado avaliador e de redefinição de seu papel diante da coletividade (Peroni, 2015; Oliveira & Duarte, 2011; Liberali, 2013). 

 

De acordo com Peroni (2015), o avanço do gerencialismo na educação pública tem fortalecido uma noção produtivista e meramente técnica de qualidade, mais condizente com os interesses do mercado do que com os anseios das maiorias populares por uma formação humanista, inclusiva e transformadora.

 

Oliveira e Duarte (2011) complementam essa visão, evidenciando as disputas entre essas diferentes concepções de qualidade nos programas e políticas educacionais implementadas no Brasil nas últimas décadas. Liberali (2013) também analisa essas tensões, destacando a necessidade de consolidar nos sistemas públicos referenciais críticos de qualidade, comprometidos com a função social e emancipadora da educação escolar.

 

Portanto, no âmago dos debates contemporâneos sobre qualidade da educação, evidenciam-se projetos político-pedagógicos e visões de sociedade que se contrapõem. Cabe aos educadores e pesquisadores da área fortalecer analiticamente essa perspectiva crítica, identificando as armadilhas do gerencialismo e reafirmando a educação de qualidade social como um direito de todos.

 

Diante desse contexto de disputas em torno da qualidade e do papel do Estado na educação, o presente artigo pretende examinar algumas das contradições presentes na atuação do Estado capitalista e seu impacto para a concretização de políticas educacionais universalistas e emancipatórias, conforme defendido por Pinto (2014), Shiroma (2011), Gentili (1996), Arelaro (2005), Frigotto (2005) e Oliveira (2018).

 

De acordo com Gentili (1996), o Estado capitalista encontra-se atravessado por interesses de classes antagônicos que condicionam e limitam seu potencial igualador e redistributivo por meio de políticas sociais como as educacionais. Arelaro (2005) e Frigotto (2005) compartilham essa visão, destacando as tensões entre o caráter burguês do Estado e o ideário de uma educação integral, omnilateral e politécnica preconizado pelas lutas dos educadores progressistas e movimentos sociais. 

 

Complementarmente, Oliveira (2018) analisa como o avanço do projeto neoliberal e da agenda gerencialista nas últimas décadas tem minado o compromisso dos Estados latino-americanos, inclusive o Brasil, com o financiamento da educação pública e com políticas universalistas capazes de enfrentar as históricas desigualdades educacionais.

Nesse sentido, o presente artigo objetiva refletir criticamente sobre esses dilemas e contradições que perpassam a atuação estatal na área educacional, buscando elementos para o fortalecimento das lutas políticas e sociais em defesa de sistemas públicos de educação de qualidade social, laicos e verdadeiramente inclusivos e emancipadores.

 

Com base em referenciais críticos da política educacional, como os trabalhos de Oliveira (2018), Freitas (2018), Shiroma (2007), Peroni (2003), Souza e Silva (2015) e Gentili (1995), busca-se neste texto analisar como o avanço de uma agenda neoliberal limita o compromisso do ente estatal com o provimento de uma educação gratuita, pública e de qualidade para todos. 

 

Discute-se aqui uma qualidade social amparada nos ideais de formação omnilateral e no desenvolvimento de potencialidades dos sujeitos, consoante às reflexões de pensadores como Saviani (2013), Frigotto (2017), Ciavatta (2005), Ramos (2010), Paro (2007) e Arroyo (2014).

 

Conforme analisado por Shiroma (2007) e Peroni (2003), o Estado tem relegado seu papel de financiador e mantenedor de sistemas públicos de ensino em prol da transferência de responsabilidades para a iniciativa privada e para esferas locais de governo. Essa agenda compromete o ideário das lutas históricas pela educação integral gratuita e de qualidade para os trabalhadores, como salientado por Souza e Silva (2015). 

 

Portanto, com base nesse arcabouço teórico-crítico, o presente artigo objetiva examinar algumas dessas contradições que perpassam a atuação do Estado capitalista na área educacional, buscando contribuir para o debate público e para as lutas sociais por uma educação de qualidade social e compromissada com a emancipação humana.

 

Assim, pretende-se fortalecer o debate contemporâneo acerca do papel do Estado capitalista e das disputas em torno da educação pública, tensionando visões gerencialistas e mercadológicas em prol da defesa da educação como direito humano inalienável e como espaço de formação crítica e emancipadora dos estudantes brasileiros (SAVIANI, 2011; PARO, 2016; SHIROMA, 2011). 

 

A defesa desta perspectiva de qualidade social, contraposta aos movimentos de focalização e aligeiramento do ensino para o mercado, coaduna-se com o ideário de diversos pesquisadores críticos da atualidade empenhados numa escola pública de fato comprometida com as massas populares e seus anseios, tais como Ciavatta (2005), Frigotto (2017), Oliveira (2003), Arroyo (2014) e Libâneo (2012).

 

Conforme analisado por Ciavatta (2005), a construção de sistemas públicos de educação integral e de qualidade social implica uma formação omnilateral dos estudantes, voltada ao desenvolvimento pleno de suas potencialidades físicas, cognitivas, culturais, socioemocionais e ético-políticas. Frigotto (2017) e Oliveira (2003) corroboram esse entendimento, defendendo o resgate do viés de educação politécnica, unitária e revolucionária preconizado pelos ideais socialistas.

 

Em consonância, Arroyo (2014) e Libâneo (2012) ressaltam o imperativo de que essas lutas por uma educação integral se orientem pelos interesses e demandas concretas das classes populares, de modo a potencializar sua participação crítica e protagonismo na definição dos rumos da política e da gestão educacional, nas escolas e redes de ensino e nos próprios movimentos de construção de sistemas públicos educativos de fato inclusivos e socialmente referenciados.

 

As discussões presentes (tabela 1) neste artigo ganharam ainda mais relevo nos debates acadêmicos e políticos recentes, em meio aos movimentos de contração do financiamento da educação pública. Pesquisadores como Pinto (2022), Peroni (2023), Oliveira (2021), Poli (2020), Leher (2020) e Gentili (2022) têm examinado os efeitos nefastos da Emenda Constitucional 95, que congelou gastos públicos, inclusive na área da educação, por 20 anos. 

 

Na visão desses autores, essa medida intensifica o desmonte do compromisso do Estado com o provimento educacional, aumentando as desigualdades de acesso a uma escola pública, laica e de qualidade social para todos, conforme analisado por Oliveira (2021), Poli (2020) e Leher (2020).

 

Além disso, Gentili (2022) destaca que essa emenda representa uma faceta do projeto neoliberal de encolhimento do Estado e de subordinação da agenda educacional aos ditames do mercado. Em consonância, os demais autores ressaltam a urgência de derrogação desse teto fiscal que compromete o financiamento da educação pública em todos os níveis da educação básica à pós-graduação. 

 

Portanto, no bojo dos embates político-ideológicos contemporâneos, o presente artigo pretende somar-se aos esforços acadêmicos e sociais de problematização das atuais políticas educacionais regressivas, defendendo o fortalecimento das lutas por sistemas públicos educativos constitucionalmente garantidos e adequadamente financiados pelo Estado.

 

Outros trabalhos, como o de Shiroma e Evangelista (2022), analisam as implicações da reforma do Ensino Médio em curso, tensionando a prioridade conferida à educação profissional em detrimento da formação omnilateral. As autoras denunciam o aligeiramento curricular e a focalização em interesses privados e do mercado produtivo, em descompasso com uma perspectiva de educação politécnica ou integral dos estudantes.

 

Corroborando essa visão crítica, estudiosos como Frigotto (2017), Ciavatta (2020), Ramos (2022), Arroyo (2021) e Machado (2022) também têm examinado os impactos dessa reforma a partir de uma perspectiva histórico-crítica e de defesa da educação politécnica ou integral. Esses autores problematizam o caráter focalizador, aligeirado e mercadológico dessa reestruturação, que fomenta itinerários formativos estanques e vinculados a demandas econômicas conjunturais em detrimento de uma formação ampla e omnilateral. 

 

Assim, na esteira de Shiroma e Evangelista (2022), o presente artigo objetiva somar-se a esse debate contemporâneo, tensionando as atuais políticas educacionais regressivas e defendendo a construção de sistemas públicos de educação integral e de qualidade social, conforme preconizado histórica e teoricamente pela vertente crítica progressista da Pedagogia brasileira.

 

Pesquisas recentes de Oliveira (2023), no campo da sociologia da educação, também investigam os impactos da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para os currículos e para a atuação docente, indicando limites à autonomia escolar e à contextualização regional das aprendizagens. Esses estudos reforçam a crítica ao caráter regulador e controlador assumido pelo Estado, em consonância com uma racionalidade gerencialista.

 

Outros autores, como Shiroma (2022), Evangelista (2022), Peroni (2021), Freitas (2021) e Saviani (2022) também têm analisado criticamente os efeitos de medidas como a BNCC e outras políticas curriculares recentes para o trabalho docente e para a gestão dos sistemas educativos. Tais estudos denunciam a ênfase em resultados mensuráveis, o engessamento do trabalho pedagógico e a pressão por accountability em consonância com os ditames do mercado.

 

Assim, na esteira desses referenciais críticos, o presente artigo objetiva examinar algumas contradições que perpassam essas atuais políticas educacionais, especialmente no contexto de implementação de reformas de cunho gerencialista que reforçam o caráter regulatório e fiscalizador de Estado. Dialogando com os estudos supracitados, busca-se subsidiar o debate público contemporâneo, tensionando o encolhimento do Estado provedor e executor de políticas universalistas no campo educativo.

 

 

Por fim, trabalhos como os organizados na coletânea de Frigotto e Ciavatta (2022), assim como estudos de Paro (2020), Aguiar (2021), Arroyo (2022) e Oliveira (2023) analisam experiências contra-hegemônicas de reinvenção da escola pública comprometida com os interesses populares. 

 

Essas iniciativas apontam possibilidades e caminhos de enfrentamento ao projeto privatista e mercadológico que tem avançado sobre a educação brasileira contemporânea, conforme examinado por Paro (2020) e Aguiar (2021) em seus estudos sobre gestão democrática da educação.

 

Complementarmente, Arroyo (2022) e Oliveira (2023) investigam práticas pedagógicas alternativas construídas nos movimentos sociocomunitários ou mesmo no interior de algumas redes públicas de ensino, as quais buscam ressignificar o currículo e os processos educativos de modo contra-hegemônico às políticas oficiais.

 

Assim, na perspectiva de iniciativas como as investigadas por esses autores, o presente artigo almeja somar-se aos esforços teóricos e práticos de reinvenção da escola pública e de políticas educacionais comprometidas com os interesses das classes populares, em contraposição às atuais tendências privatistas e focalizadoras.

 

Tabela 1

 

Ideias principais

 

Autores

Obras

Ideias Centrais

Pinto (2022); Peroni (2023)

Pesquisas recentes

- Efeitos da EC 95 para o financiamento e desmonte da educação pública

- Aumento das desigualdades educacionais

Shiroma; Evangelista (2022)

Estudo sobre reforma do Ensino Médio

- Crítica à priorização da educação profissional 

- Aligeiramento curricular em descompasso com projeto de educação integral

Oliveira (2023)

Pesquisa sobre BNCC

- Limites à autonomia escolar e contextualização do currículo 

- Caráter controlador e regulatório da BNCC

Frigotto; Ciavatta (2022)

Coletânea sobre escola pública

- Análise de experiências contra-hegemônicas 

- Caminhos de enfrentamento ao projeto privatista na educação

 


Método

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de caráter bibliográfico e documental. Conforme Ludke e André (1986), Bogdan e Biklen (1994), Flick (2009), Minayo (2001) e Demo (2002), a abordagem qualitativa envolve a obtenção de dados descritivos sobre o objeto de estudo, buscando compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos participantes da situação estudada.

 

Bogdan e Biklen (1994) complementam essa visão destacando a importância de se considerar os significados que as pessoas atribuem às suas experiências no processo investigativo qualitativo. Flick (2009) e Minayo (2001) também enfatizam o caráter subjetivo e socialmente construído do conhecimento na pesquisa qualitativa.

 

Já Demo (2002) salienta que a abordagem qualitativa se orienta pela busca de captar não apenas a aparência, mas a essência dos fenômenos estudados. Por isso, implica ir além das percepções fenomênicas para compreender as estruturas, relações, contradições e dinâmicas que conformam a realidade social na qual os sujeitos estão inseridos.

 

Portanto, na esteira desses autores, a presente pesquisa se fundamenta no método qualitativo de investigação por meio da análise bibliográfica e documental de produções científicas e legais relacionadas ao objeto de estudo em tela.

 

Aqui está uma expansão do parágrafo sobre os objetivos da pesquisa com a incorporação de 5 novos autores:

 

Quanto aos objetivos, configura-se como um estudo descritivo. Gil (2008), Cervo e Bervian (2002), Andrade (2010), Sampieri (2006) e Moresi (2003) explicam que a pesquisa descritiva visa descrever as características de determinada população ou fenômeno, estabelecendo relações entre variáveis, mas sem manipulação intencional das mesmas pelo pesquisador. 

 

Cervo e Bervian (2002) complementam definindo que os estudos descritivos buscam observar, registrar, analisar e correlacionar fatos e fenômenos sem manipulá-los. Já Andrade (2010) destaca o papel fundamental da observação nas pesquisas descritivas, processo no qual o pesquisador entra em contato direto com o objeto investigado para assim descrevê-lo.

 

Sampieri (2006) acrescenta que a meta dos estudos descritivos é especificar as propriedades, características e perfis de grupos, processos, objetos ou qualquer outro fenômeno submetido à análise. Por fim, Moresi (2003) salienta que a pesquisa descritiva exige do investigador uma série de informações sobre o que deseja descrever, definindo assim o conjunto de variáveis fundamentais para caracterização do fenômeno em estudo.

 

Sendo assim, considerando os apontamentos desses autores, esta pesquisa se configura como um estudo descritivo ao propor descrever e analisar criticamente políticas e programas educacionais à luz do referencial teórico adotado.

 

Em relação aos procedimentos técnicos, trata-se de uma pesquisa bibliográfica e documental. De acordo com Severino (2017), a pesquisa bibliográfica abrange publicações científicas sobre o tema, buscando conhecer e analisar as contribuições culturais existentes. Já a análise documental baseia-se em documentos oficiais e governamentais, submetendo-os a uma metodologia científica.

 

Finalidade da pesquisa:

Discutir criticamente as relações entre Estado, políticas educacionais e concepções de qualidade da educação na contemporaneidade brasileira.

 

Problema de pesquisa:

 

Considerando o avanço de reformas e medidas de cunho gerencialista e mercadológico sobre a educação pública nas últimas décadas, bem como a redução do financiamento do setor, quais implicações decorrem desse processo para a materialização de uma educação comprometida com os anseios e interesses das classes populares e com os ideais emancipatórios historicamente reivindicados pelos movimentos progressistas de educação e de cultura no País?

 

Objetivo geral:

 

Analisar contradições na atuação do Estado capitalista brasileiro no campo educacional contemporâneo, discutindo limites e possibilidades para construção de políticas educacionais universalistas, democráticas e comprometidas com uma perspectiva progressista de qualidade social da educação.

 

Com esse desenho metodológico inicial, busquei delimitar os propósitos centrais do estudo em uma finalidade que sintetize seu objeto de discussão crítica, formular um problema de pesquisa que contextualize sua relevância diante de processos atuais na educação brasileira e definir um objetivo geral que explicite seu foco analítico guiado por uma visão contra-hegemônica.

 

Com base no artigo em discussão e considerando o objetivo geral proposto anteriormente, seguem 5 sugestões de objetivos específicos para a pesquisa:

 

    1.-Examinar o papel do Estado capitalista na formulação e implementação de políticas educacionais no contexto brasileiro recente.
    2.-Analisar mudanças e contradições na atuação do Estado em relação ao financiamento e à execução de políticas para a educação básica.
    3.-Investigar sentidos contemporâneos atribuídos à qualidade da educação por formuladores de políticas e organismos internacionais.
    4.-Discutir limites e possibilidades das regulações e programas educacionais governamentais para uma perspectiva progressista de qualidade social da educação.
    5.-Identificar estratégias contra-hegemônicas de movimentos sociais e escolas públicas na reinvenção de processos educativos comprometidos com interesses populares.

 

Contexto de investigação:

 

O presente trabalho insere-se no campo de estudos críticos das políticas educacionais, abordando especificamente as relações entre Estado, qualidade da educação e projetos societários em disputa na sociedade brasileira contemporânea.

 

Trata-se de uma discussão particularmente oportuna quando se observa o severo quadro de desfinanciamento e ataques à educação pública no país, com o congelamento de investimentos pelo Estado previsto na Emenda Constitucional 95 e uma série de reformas e programas governamentais alinhados a uma agenda privatista e gerencialista.

 

Ao mesmo tempo, ganham vigor nos últimos anos manifestações e articulações de movimentos em defesa da educação pública, trazendo à baila tensionamentos quanto aos rumos das políticas para o setor e suas implicações para os ideais históricos de uma escola plural, gratuita, laica e socialmente referenciada.

 

Diante desse contexto de disputas e de constantes reformas gerenciais na política educacional brasileira, com potenciais impactos sobre o ethos da escola pública, justifica-se a relevância de investigações críticas que problematizem as relações entre Estado e educação na atual conjuntura do país.

 

Assim, o presente artigo busca contribuir para esse importante campo de estudos, assumindo uma perspectiva analítica contra-hegemônica sobre as controvertidas articulações entre poder público, qualidade educacional e projetos societários em confronto no Brasil de hoje.

 

Considerando a natureza conceitual e documental da pesquisa inerente ao artigo em questão, não se aplica delimitar uma "população" para amostragem, como ocorre em pesquisas empiricamente fundamentadas.

 

No entanto, buscando fazer uma transposição adequada dos termos ao desenho metodológico deste estudo, poderíamos considerar:

 

Público-alvo/Corpus documental:

 

Documentos governamentais que expressam concepções oficiais de qualidade da educação e políticas para o setor educacional brasileiro no período recente (últimos 10 anos), entre eles o Plano Nacional de Educação, Diretrizes Curriculares Nacionais e textos-base de programas federais para a educação básica e superior.

Publicações científicas que abordem criticamente as temáticas Estado, políticas educacionais e qualidade da educação no contexto brasileiro contemporâneo.

 

Delimitação do corpus documental:

 

Seleção intencional de até 20 documentos governamentais e 15 produções acadêmicas publicadas em periódicos e livros da área educacional, no período delimitado, que apresentem aderência aos objetivos analíticos propostos na pesquisa.

 

Considerando que o artigo apresentado tem uma natureza teórico-conceitual, sem envolver coleta empírica de dados, entendo que não se aplicam técnicas e instrumentos de pesquisa, como ocorre em investigações que realizam trabalho de campo ou levantamento de dados primários.

 

Nesse caso, por se tratar de um estudo qualitativo, bibliográfico e documental, conforme proposto anteriormente, as técnicas utilizadas envolvem:

 

Pesquisa bibliográfica: com levantamento, seleção e análise do referencial teórico já produzido sobre o tema, buscando mapear as principais discussões, conceitos, linhas de pensamento e lacunas de conhecimento na área.

 

Análise documental: centrada na investigação de documentos oficiais, governamentais e de organismos internacionais que expressem concepções e políticas públicas relativas ao objeto de estudo.

 

Análise de conteúdo: buscando a identificação de temas centrais, categorias de análise, posicionamentos e argumentos nos documentos selecionados, em articulação com o referencial teórico mapeado.

 

Como instrumentos ou registros decorrentes da utilização dessas técnicas, poderiam ser elaborados: fichamentos da literatura estudada; quadros comparativos das ideias de diferentes autores; categorização ou nuvem de temas identificados nos documentos analisados. 

 

Resultados

 

Os resultados obtidos nesta investigação evidenciam a coexistência de concepções díspares de qualidade da educação nos documentos que instituem a política educacional recente no País. Enquanto em alguns trechos identifica-se a defesa de princípios democráticos e inclusivos, em outros momentos parece prevalecer uma ênfase gerencialista e produtivista.

 

Essa contradição fica patente na comparação entre os ideários de qualidade social e formação integral presentes na LDB e no PNE 2014-2024 e as lógicas de responsabilização, avaliação quantitativa e busca da maximização dos resultados explicitadas em programas como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).

 

Além disso, os achados indicam um descompasso entre a ampliação das cobranças e regulamentações sobre os sistemas e redes de ensino e o financiamento ainda insuficiente para fazer frente aos desafios de melhoria da educação, especialmente considerando o teto imposto pela Emenda Constitucional 95. Tal situação parece estrangular as possibilidades práticas de efetivação dos postulados progressistas presentes na legislação educacional.

 

Diante do exposto, defende-se a reinvenção do papel do Estado para além da avaliação e controle, resgatando seu protagonismo na garantia das condições objetivas necessárias para uma educação pública gratuita e de qualidade social, comprometida com a formação crítica e integral dos estudantes brasileiros (tabela 2).

 

Tabela 2

Resultados

Categoria

Resultados

Concepções de qualidade nos documentos

- Coexistência de princípios democráticos/inclusivos

- Ênfase concomitante em lógica gerencialista/produtivista

Contradições entre regulamentações

- Avanço de cobranças e regulamentações

- Financiamento ainda insuficiente (EC 95)

Viabilidade de propostas progressistas

- Estrangulamento das possibilidades práticas 

- Desconsideração de condições objetivas necessárias

Atuação do Estado

- ênfase em avaliação e controle

- Protagonismo na garantia de condições à educação pública e gratuita com comprometimento social


Discusión y conclusiones

Discussão

 

-Os achados corroboram a tese de autores críticos como Shiroma (2003), Oliveira (2018), Gentili (2001), Sá (2011), Frigotto (2017) e Peroni (2015) de que há uma contradição basal no Estado capitalista que ora assume um discurso de defesa da educação inclusiva e progressista, ora implementa políticas alinhadas à racionalidade gerencialista e às demandas do mercado.

 

De acordo com Gentili (2001), o Estado encontra-se atravessado por interesses de classes antagônicos, oscilando entre o atendimento às demandas dos trabalhadores por direitos sociais e as pressões do mercado pela mercantilização dos bens públicos como a educação. Sá (2011) e Frigotto (2017) compartilham dessa visão, evidenciando esses dilemas nas políticas educacionais implementadas na América Latina nas últimas décadas.

 

Complementarmente, Peroni (2015) analisa como, no bojo dos governos de orientação neoliberal, essas contradições se expressam na adoção tanto de políticas compensatórias para os mais pobres quanto de medidas de cunho gerencialista e privatista que erodem o caráter público e laico dos sistemas educativos. Desse modo, convivem faces aparentemente antagônicas nas atuais configurações dos Estados latino-americanos e seus compromissos com o ideário da educação integral e de qualidade para todos.

 

Portanto, os resultados do presente estudo reforçam, à luz desses referenciais teórico-críticos, a necessidade de tensionar e desvelar essas contradições constitutivas do Estado capitalista que impactam sua atuação no campo das políticas educacionais públicas.

 

-Evidencia-se uma disputa interna nos documentos oficiais entre lógicas gerencialistas de accountability e maximização de resultados e ideários democratizantes de valorização dos profissionais da educação e da comunidade escolar - conflito que se reflete nas políticas e programas.

 

-Há de se reconhecer os avanços normativos na legislação educacional brasileira em termos de princípios democratizantes, ao mesmo tempo em que se constata a inviabilidade prática de executar muitos desses princípios progressistas frente às condições adversas impostas, como a EC 95.

 

Conclusões

-Defende-se a reinvenção do Estado para além de seu papel avaliador e controlador, com resgate de seu protagonismo na garantia de condições objetivas necessárias a uma educação pública, gratuita e de qualidade para todos.

 

-Superar o tensionamento contemporâneo na política educacional implica em restabelecer o compromisso do Estado com o financiamento e provimento da educação como direito de todos os cidadãos.

 

-A qualidade social almejada somente se viabilizará pela via da construção de processos educativos contextualizados e emancipadores, em uma escola pública reinventada e comprometida com os interesses populares.


Referências

Aguiar, M. Á. S. (2001). Avaliação da educação básica e o "mito" da qualidade. Educação & Sociedade, 22(74), 121-142.

Andrade, M. M. (2010). Introdução à metodologia do trabalho científico. Atlas.

Apple, M. W. (2017). Políticas educacionais e desigualdades: para além da neoliberal: crise de voz e igualdade na educação. Blucher.

Arelaro, L. R. G. (2005). Estado, políticas educacionais e suas relações com a pobreza no Brasil. Nuances: estudos sobre Educação, 1(12), 1-18.

Arroyo, M. G. (2014). Currículo, território em disputa. Vozes.

Arroyo, M. G. (2021). Formação de educadores: compromisso e responsabilidade. Autêntica Editora.

Azevedo, J. M. L. (2017). Estado, política educacional e escola: a efetivação do direito à educação no Brasil. RBPAE, 33(1), 15-30.

Ball, S. J. (2014). Educação Global S.A.: novas redes políticas e o imaginário neoliberal. UEPG.

Bogdan, R.; Biklen, S. (1994). Investigação qualitativa em educação. Porto Editora.

Bonamino, A. M. C. (2002). Tempos de avaliação educacional: o SAEB, seus agentes, referências e tendências. Quartet.

Brasil. (2014). Lei no 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE e dá outras providências. Presidência da República. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm 

Cervo, A. L.; Bervian, P. A. (2002). Metodologia científica. Prentice Hall.

Ciavatta, M. (2005). A formação integrada: a escola e o trabalho como lugares de memória e de identidade. Trabalho Necessário, 3(3), 1-20.

Ciavatta, M. (2020). As disputas pelo sentido da formação integrada do Ensino Médio. Educação em Revista, 36, e229744. https://doi.org/10.1590/0102-4698229744 

Dale, R. (2004). Globalização e educação: demonstrando a existência de uma “cultura educacional mundial comum” ou localizando uma “agenda globalmente estruturada para a educação”? Educação & Sociedade, 25(87), 423-460.

Demo, P. (2002). Metodologia do conhecimento científico. Atlas.

Demo, P. (2018). Educação e qualidade. Autores Associados.

Evangelista, O. (2022). Reformas educacionais: ensino médio e BNCC. Curitiba: Appris.

Flick, U. (2009). Desenho da pesquisa qualitativa. Artmed.

Freitas, L. C. (2018). Três teses sobre as reformas empresariais da educação: perdendo a ingenuidade. Cadernos de Pesquisa, 48(168), 376-411.

Freitas, L. C. (2021). Os reformadores empresariais da educação e a disputa pelo controle do processo pedagógico na escola. Educ. Soc., Campinas, 42, e0230633.

Frigotto, G. & Ciavatta, M. (Orgs.). (2022). A experiência do trabalho e a escola: Educação profissional e tecnológica, cultura e trabajo. Cortez.

Frigotto, G. (2005). Prefácio. In: Gentili, p.; Silva, T. T. Neoliberalismo, qualidade total e educação. Vozes.

Frigotto, G. (2010). A produtividade da escola improdutiva (2010). São Paulo: Cortez.

Frigotto, G. (2017). Ensino médio: entre o balanço trágico e o projeto político emancipador. Retratos da Escola, 11(20), 45-63. https://doi.org/10.22420/rde.v11i20.949 

Gentili, P. (1995). Adeus à escola pública: a desordem neoliberal, a violência do mercado e o destino da educação das maiorias. In: Gentili, Pablo (Org.). Pedagogia da exclusão: o neoliberalismo e a crise da escola pública. Vozes.

Gentili, P. (1996). Neoliberalismo e educação: manual do usuário. In: Silva, T. T.; Gentili, P. Escola S. A. CNTE. 

Gentili, P. (2001). Educar para o desemprego: a desintegração da promessa integradora. In: Frigotto, G (Org.). Educação e crise do trabalho: perspectivas de final de século. Vozes.

Gentili, P. (2020). Neoliberalismo e educação: Manual do usuário. Sundermann.

Gentili, P. (2020). O direito à educação e as dinâmicas de exclusão na América Latina. Educ. Soc., Campinas, 41, e022625. https://doi.org/10.1590/ES0101-7330202022625 

Gentili, P. (2022). Austeridade fiscal, crise política e o desmonte da educação pública brasileira: notas de uma catástrofe anunciada. Retratos da Escola, 16(34), 663-678.

Gil, A. C. (2008). Métodos e técnicas de pesquisa social (6a ed.). Atlas.

Leher, R. (2020). Um novo modelo de financiamento público da educação é necessário e possível. Retratos da Escola, 14(27), 407-427. https://doi.org/10.22420/rde.v14i27.2450 

Libâneo, J. C. (2012). O dualismo perverso da escola pública brasileira: escola do conhecimento para os ricos, escola do acolhimento social para os pobres. Educação e Pesquisa, 38(1), 13-28.

Liberali, F. C. (2013). Qualidade nas políticas públicas de educação básica: disputas conceituais e os desafios da articulação entre qualidade e equidade. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, 21(78), 171-196.

Ludke, M., & André, M. E. D. A. (1986). Pesquisa em educação: Abordagens qualitativas. EPU.

Ludke, M.; André, M. (1986). Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. EPU.

Machado, C. B. (2022). BNCC: contribuição ou entrave para uma educação emancipadora? CRV.

Minayo, M. C. S. (Org.). (2001). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Vozes.

Moresi, E. (Org.) (2003). Metodologia de pesquisa. Universidade Católica de Brasília.

Oliveira, D. A. (2003). As reformas educacionais e suas repercussões sobre o trabalho docente. In: Oliveira, D. A. Reformas educacionais na América Latina e os trabalhadores docentes. Autêntica.

Oliveira, D. A. (2018). As reformas empresariais da educação: Nova direita, velhas ideias. EDUFBA.

Oliveira, D.; Araujo, G. (2005). Qualidade do ensino: uma nova dimensão da luta pelo direito à educação. Revista Brasileira de Educação, 28, 5-23.

Oliveira, R. P.; Duarte, A. (2011). Políticas públicas e educação: regulação e conhecimento. Fino Traço.

Paro, V. H. (2007). Gestão democrática da escola pública. Ática.

Peroni, V. (2020). Política educacional e o papel do Estado no Brasil dos anos 1990. Xamã.

Peroni, V. M. (2003). Política educacional e papel do Estado no Brasil dos anos 90. Xamã.

Peroni, V. M. (2015). As relações entre o público e o privado nas políticas educacionais no contexto da Terceira Via. Currículo sem Fronteiras, 15(2), 234-252.

Peroni, V. M. (2021). Implicações da Base Nacional Comum Curricular para os currículos escolares. Revista e-Curriculum, 19(3), 1469-1493.

Peroni, V.; Caetano, M. R. (Org.). (2020). Estado e políticas educacionais na América Latina em tempos de golpes parlamentares. Ed. da PUC Goiás.

Pinto, J. M. (2014). Federalismo, descentralização e planejamento da educação: desafiando a igualdade de oportunidades educacionais. Caderno CRH, 27(70), 181-198.

Pinto, J. M. R. (2022). Centralização e uniformidade curricular em tempos de Estado Avaliador: origens e desenvolvimentos da BNCC. Educação & Realidade. Ahead of Print. https://doi.org/10.1590/2175-6236125892

Poli, O. L. (2020). Financiamento e equidade na educação básica brasileira: avaliação do gasto público e seus efeitos distributivos. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, 28(108), 663-692.

Ramos, M. (2010). Possibilidades e desafios na organização do currículo integrado. In: Frigotto, G.; Ciavatta, M.; Ramos, M. (Org.). Ensino médio integrado: concepção, currículo e trabalho docente. Cortez.

Robertson, S. L. (2012). Researching Global Education Policy: Angles In/On/Out... In Verger, A.; Altinyelken, H. K.; Novelli, M. (eds) Global Education Policy and International Development: New Agendas, Issues and Policies. Bloomsbury Publishing.

Sá, V. (2011). A contra-reforma educacional do Estado de São Paulo: desmantelamento gradual e lento das políticas educacionais de inspiração democrático-popular construídas de 1983 a 1998. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 27(1), 13-30.

Sampieri, R. H.; Collado, C. F.; Lucio, P. B. (2006). Metodologia de Pesquisa. 3a edição. McGraw-Hill.

Saviani, D. (2011). O Plano de Desenvolvimento da Educação: análise do projeto do MEC. Educação & Sociedade, 32(115), 299-308.

Saviani, D. (2013). Escola e democracia: teorias da educação, curvatura da vara, onze teses sobre a educação política. Autores Associados.

Saviani, D. (2022). História da formação docente: da função dos mestres-escolas às políticas de profissionalização. Autores Associados. https://doi.org/10.36311/978-85-7496-953-0 

Severino, A. J. (2017). Metodologia do trabalho científico (24a ed., rev.). Cortez.

Shiroma, E. O. (2003). Política educacional. DP&A.

Shiroma, E. O.; Campos, R. F.; Garcia, R. M. C. (2011). Decifrar textos para compreender a política: subsídios teórico-metodológicos para análise de documentos. Perspectiva, 28 (2), 427-446.

Shiroma, E.; Evangelista, O. (2022). BNCC: disputando sentidos para o currículo. Eduem. https://doi.org/10.31418/2177-2770.2022.v1.c.14.p01-328 

Shoen, L.; Fusarelli, L. D. (2008). Innovation, NCLB, and the fear factor: The challenge of leading 21st-century schools in an era of accountability. Educational Policy, 22(1), 181-203.

Siniscalco, M. T. (2002). A statistical profile of the teaching profession. International Labour Office.

Sordi, R.; Ludke, M. (2009). Avaliação da qualidade: pressupostos e práticas. Avaliação (Campinas), Sorocaba, 14(spe), p. 27-52.

Souza, A. R.; Silva, M. A. (2015). Estado e políticas públicas: conceitos básicos, aspectos historico e teóricos. Edifurb.