MLS – INCLUSION AND SOCIETY JOURNAL (MLSISJ)http://mlsjournals.com/ISSN: 2603-5820 |
|
(2024) MLS-Inclusion and Society Journal, 4(2),115-129 – doi.org/10.56047/mlsisj.v4i.2.3313
Educação cultural indígena para não indígenas: proposta pedagógica para a valorização da diversidade e efetivação da lei nº 11.645/2008
Clayton Ferreira dos Santos Scarcella
Universidad Europea del Atlántico (España)
Clayton.fs7@gmail.com · https://orcid.org/0009-0007-2653-9329
Resumo: A educação intercultural e decolonial ainda é um desafio no contexto educacional brasileiro, especialmente considerando a implementação da Lei 11.645/2008. Este estudo analisou uma intervenção pedagógica realizada em uma escola pública paulistana, o Centro Municipal de Capacitação e Treinamento Professor Lenine Soares de Jesus, em São Paulo, com o objetivo de diminuir etnocentrismos e preconceitos étnicos por meio da educação da cultura indígena. A metodologia envolveu uma intervenção estruturada em sete etapas, desenvolvida durante um curso bimestral de qualificação em Informática, incluindo pesquisa e apresentação, contação de histórias, visita virtual a aldeias indígenas, arte indígena, culinária indígena, debates e criação de jogos educativos alicerçada em uma revisão de literatura focada, principalmente em pesquisadores brasileiros e latino-americanos com estudos nas áreas de educação étnico-racial, educação decolonial e educação intercultural. Os resultados, obtidos através de uma pesquisa qualitativa utilizando a técnica da observação participante, demonstraram mudanças graduais nas atitudes dos estudantes em relação à temática indígena, evidenciando a necessidade de estudos longitudinais para avaliar impactos de longo prazo na comunidade local e no ambiente profissional em que estes egressos estiverem inseridos. A intervenção revelou que transformações culturais significativas requerem tempo e continuidade, sugerindo a importância de programas educacionais mais extensos e do envolvimento da comunidade escolar.
Palavras-chave: Educação intercultural, educação decolonial, educação étnico-racial.
Indigenous cultural education for non-indigenous people: pedagogical proposal for the appreciation of diversity and implementation of Law No. 11.645/2008
Abstract: Intercultural and decolonial education is still a challenge in the Brazilian educational context, especially considering the implementation of Law 11.645/2008. This study analyzed a pedagogical intervention carried out in a public school in São Paulo, the Centro Municipal de Capacitação e Treinamento Professor Lenine Soares de Jesus, in São Paulo, with the objective of reducing ethnocentrism and ethnic prejudices through the education of indigenous culture. The methodology involved an intervention structured in seven stages, developed during a bimonthly qualification course in Informatics, including research and presentation, storytelling, virtual visit to indigenous villages, indigenous art, indigenous cuisine, debates and creation of educational games based on a literature review focused mainly on Brazilian and Latin American researchers with studies in the areas of ethnic-racial education, decolonial education and indigenous education. The results, obtained through a qualitative research using the technique of participant observation, demonstrated gradual changes in the attitudes of students in relation to the indigenous theme, evidencing the need for longitudinal studies to assess long-term impacts on the local community and the professional environment in which these graduates are inserted. The intervention revealed that significant cultural transformations require time and continuity, suggesting the importance of more extensive educational programs and the involvement of the school community.
Keywords: Intercultural education, decolonial education, ethnic-racial education.
Introdução
Localizada na região do Itaim Paulista, zona leste da cidade de São Paulo, o Centro Municipal de Capacitação e Treinamento Professor Lenine Soares de Jesus é uma unidade escolar pública, da Secretaria Municipal de Educação, da Prefeitura do Município de São Paulo, que oferece qualificação profissional a estudantes do ensino regular da rede municipal de educação e comunidade local. Apesar de seu ambiente tranquilo, a escola carrega consigo um grande problema: o preconceito e o racismo em relação aos povos nativos. Os alunos, influenciados por estereótipos e pela falta de informação, propagam comentários discriminatórios e demonstram uma postura desrespeitosa em relação aos autóctones. Tal diagnóstico foi percebido a partir de uma proposta de atividade relacionada à temática indígena, em que os discentes foram convidados a ler um texto sobre os “10 erros comuns sobre as culturas indígenas no Brasil”, disponível em https://ensinarhistoria.com.br/10-erros-comuns-nas-aulas-de-cultura-indigena, numa turma do curso de qualificação profissional em informática, no ano de 2023.
A intenção do educador pautava-se na contribuição para a efetivação da Lei nº 11.645/2008, que estabelece a obrigatoriedade da inclusão da temática "História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena" nos currículos escolares, reconhecendo a importância dessa lei para a promoção de uma educação mais inclusiva, que valorize a diversidade cultural presente no Brasil e contribua para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária (Gonçallo et al., 2018). No contexto específico dos povos originários, compreende-se que é fundamental ir além da simples abordagem da história e cultura, mas também proporcionar experiências que levem o estudante a ter uma ampla visão da realidade dessas comunidades, suas lutas, saberes e contribuições para a formação da identidade brasileira.
De acordo com o documento “Povos Indígenas: Orientações Pedagógicas”, produzido e disponibilizado pela Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, alguns termos como “índios”, “tribos” e a noção de que o Brasil foi descoberto precisam ser repensados. Sobre o termo “índios”, o documento afirma que:
Durante muito tempo aprendemos a chamar os primeiros habitantes do Brasil de índios. Esta alcunha – para usar uma palavra erudita – trazia consigo imagens e significados que nem sempre dignificavam àqueles a quem ela desejava nomear. Normalmente, vinha acompanhada por adjetivos que não faziam jus à riqueza da diversidade que ela compunha. Quase sempre significava atraso tecnológico, primitivismo, canibalismo, entre outros termos negativos. Nomear alguém com essa palavra era qualificá-lo aquém dos demais seres humanos e enquadrá-lo em um passado imemorial, que nem mais existia. Essa ideia congelava os “índios” a um passado tão remoto que a vaga lembrança deles nos remetia à dos homens das cavernas ou dos dinossauros. Assim eram estudados: como seres do passado. (SÃO PAULO, 2019, p. 14).
Os professores, docentes de Informática Educativa, perceberam essa situação preocupante e, como educadores sensíveis e comprometidos com a promoção da igualdade e do respeito, decidiram mudar essa realidade. Primeiramente, ao buscar referencial teórico e estudar sobre a rica cultura e história dos povos indígenas, entenderam que seria necessário desconstruir os estereótipos e ampliar a visão dos discentes sobre essa população importante e marginalizada da nossa sociedade. Para isso, foi planejado levar para a sala de aula materiais didáticos, audiovisuais, imagens e livros que abordassem a temática indígena de forma respeitosa, que valorize suas culturas e seja acurada. Além disso, era interessante a promoção de debates e atividades que permitissem aos alunos expressarem suas ideias e opiniões, e que os encorajem a compartilhar suas dúvidas, medos e preconceitos. Houve, ainda, a ideia de convidar uma líder indígena da região para visitar a escola, contar suas experiências e compartilhar suas tradições e conhecimentos.
A Lei nº 11.645/2008 representa um marco importante na história da educação brasileira ao estabelecer a obrigatoriedade da inclusão da temática "História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena" nos currículos escolares. Especificamente em relação aos povos indígenas, essa legislação busca promover uma educação mais inclusiva, valorizando a diversidade cultural e contribuindo para a construção de uma sociedade mais justa. Para Coelho e Soares (2016), tal legislação contribui para “colocar oficialmente discursos e vozes historicamente silenciados nos currículos das nossas escolas”. Trata-se de um compromisso em desafiar estereótipos e preconceitos arraigados em nossa sociedade, proporcionando aos estudantes uma visão ampla e aprofundada sobre a realidade dos povos originários.
A construção desta proposta pedagógica tornou-se essencial para alcançar esse objetivo, pois pretendesse, nesta unidade escolar, ir além do conteúdo teórico, permitindo que os discentes tenham acesso a informações contextualizadas, atualizadas e respeitosas sobre a história, cultura, crenças, valores, tradições e modo de vida dos povos nativos de modo a valorizar “os significados expressos de cada pessoa com seus valores e padrões, relacionados à vida social dos diversos grupos estabelecidos, seja consciente ou inconscientemente, perpassando gerações que conservam ou transformam tais tradições.” (Melo e Senhoras, 2022, p. 27)
Essa proposta de trabalho foi desenvolvida levando em consideração a diversidade étnica, linguística e cultural dos povos autóctones presentes em nosso país, como determina a BNCC (Brasil, 2018, p. 15). Para tanto, a Base Nacional Comum Curricular orienta a elaboração dos currículos para se adequar às diferentes modalidades de ensino. No caso da Educação Escolar Indígena, devem ser asseguradas competências específicas a serem desenvolvidas a partir de suas culturas tradicionais.
Desenho de intervenção
O objetivo desse desenho de intervenção foi diminuir etnocentrismos e preconceitos étnicos por meio da educação da cultura indígena, promovendo a valorização da diversidade, de acordo com a Lei nº 11.645/2008. Na análise inicial, fez-se necessário realizar um diagnóstico para identificar o nível de conhecimento, percepções e preconceitos dos educandos em relação aos povos nativos. Isso foi feito por meio de questionários, debates em sala de aula ou atividades de reflexão. Concomitantemente ao diagnóstico, entendíamos como necessário promover formação e capacitação para os professores da unidade escolar sobre a temática indígena, abordando conceitos-chave do multiculturalismo, pluriculturalismo e interculturalismo, bem como etnocentrismo e preconceito étnico. Essa formação deveria incluir informações sobre a história, cultura e diversidade dos povos indígenas no Brasil.
A intervenção proposta nesse trabalho considera para o desenvolvimento intercultural os critérios para o desenvolvimento da interculturalidade articulado ao enfoque metodológico didático intercultural cooperativo, socioafetivo e comunicativo, além de aplicar o princípio da diversificação na execução de uma didática intercultural. Candau, uma renomada educadora brasileira mundialmente reconhecida por suas contribuições no campo da educação multicultural e inclusiva, foca na importância da interculturalidade como meio de promover a inclusão social e educacional, particularmente no contexto das populações indígenas. Candau (2010) defende que a educação deve ser um espaço de diálogo entre diferentes culturas, onde o currículo escolar inclua e valorize os saberes tradicionais e contemporâneos dos povos indígenas. Propõe práticas pedagógicas que integram a diversidade cultural como elemento central no processo de ensino-aprendizagem, pois acredita que a formação de professores deve incluir o desenvolvimento de competências interculturais para que possam atuar de forma eficaz em contextos multiculturais. Além disso, enfatiza a necessidade de políticas educacionais que apoiem a implementação de currículos inclusivos e interculturais.
Entre outros autores brasileiros e latino-americanos que discutem a interculturalidade na educação indígena, destaca-se José Licínio Backes, que aborda a construção de currículos interculturais e decoloniais pelos próprios povos indígenas, enfatizando a importância de uma educação que reconheça e valorize a autonomia cultural indígena (Backes, 2018). Ana Paula Franco Nobile Brandileone e Thiago Alves Valente também exploram a interculturalidade na literatura indígena para estudantes, ressaltando o desafio de integrar essas narrativas no ambiente escolar (Brandileone & Valente, 2018).
Backes (2018), em seu trabalho, enfatiza a importância da luta política para a construção de um currículo que respeite e valorize a autonomia cultural dos povos indígenas. Argumenta que é necessário superar as estruturas coloniais que ainda permeiam o sistema educacional, promovendo uma educação que seja verdadeiramente intercultural e que reconheça os saberes indígenas como parte essencial do processo educativo. Brandileone e Valente (2018) exploram a interculturalidade através da literatura indígena para crianças. Eles destacam que a literatura pode ser uma ferramenta para introduzir as narrativas indígenas no ambiente escolar, promovendo o respeito e a compreensão das culturas indígenas desde a infância. Ainda ressaltam que a inclusão de obras literárias indígenas no currículo escolar pode ajudar a combater estereótipos e preconceitos, além de enriquecer o repertório cultural dos estudantes. Os autores também apontam desafios significativos, como a falta de materiais adequados e a necessidade de formação continuada dos professores para que possam mediar essas narrativas, ao passo que defendem que a educação intercultural deve ser um compromisso de toda a comunidade escolar, envolvendo não apenas professores, mas também gestores, estudantes e suas famílias.
As leis 10.639/2003 e 11.645/2008 são marcos legais que buscam integrar a história e cultura afro-brasileira e indígena nos currículos escolares. A Lei 10.639/2003 foca na história e cultura afro-brasileira, enquanto a Lei 11.645/2008 amplia essa obrigatoriedade para incluir a história e cultura indígena. Ambas as leis visam promover a diversidade cultural e combater o racismo, mas enfrentam desafios na implementação, sejam eles a formação inadequada de professores e a falta de materiais didáticos como apontado por Brandileone & Valente (2018) ou até mesmo um compromisso mais enfático dos currículos escolares e um compromisso no chão da escola, com a comunidade escolar. Candau (2012) vê essas leis como fundamentais, mas insuficientes para garantir a verdadeira inclusão dos povos indígenas. Ela defende que, além da legislação, é necessário um compromisso das escolas em transformar o currículo e as práticas pedagógicas para refletirem a diversidade cultural do país. Backes (2018) concorda, destacando a necessidade de uma abordagem decolonial que vá além do cumprimento legal, promovendo uma educação verdadeiramente intercultural.
Tais legislações foram criadas no Brasil com o objetivo de promover a inclusão e o reconhecimento das contribuições culturais e históricas dos afro-brasileiros e indígenas no país. Entre os principais motivos para a criação destas leis, elencamos:
Pesquisadores e autores brasileiros têm discutido amplamente o impacto e a implementação dessas leis. Muitos destacam a importância dessas legislações como um passo significativo para a inclusão, mas também apontam desafios na sua implementação. Uns argumentam que, apesar de serem fundamentais, as leis enfrentam barreiras significativas, como a falta de formação adequada dos professores e a escassez de materiais didáticos apropriados e que, para além das leis, é necessário um compromisso real das escolas em transformar o currículo e as práticas pedagógicas (Candau, 2010). Outros, enfatizam a importância de uma abordagem mais crítica e decolonial na educação, que vá além do simples cumprimento legal e promova uma verdadeira transformação nas práticas educativas (Carvalho, 2019) e há análises que, embora as leis sejam um avanço, a implementação efetiva depende de políticas públicas robustas e de um compromisso governamental mais forte para promover uma educação que seja verdadeiramente intercultural (Faustino et al., 2022).
Essas perspectivas indicam que, embora as leis 10.639/2003 e 11.645/2008 representem avanços importantes, ainda há um longo caminho a percorrer para garantir que seus objetivos sejam plenamente alcançados nas escolas brasileiras. A implementação efetiva requer uma abordagem integrada que envolva a formação de professores, a produção de materiais didáticos adequados e o engajamento de toda a comunidade escolar.
Para promover o respeito e a inclusão da temática indígena na sala de aula, diversos autores propõem abordagens práticas e teóricas. Teixeira De Menezes (2020) sugere a criação de espaços de diálogo intercultural, onde estudantes indígenas e não indígenas possam compartilhar experiências e conhecimentos, enriquecendo o ambiente de aprendizagem. A literatura infantil pode ser uma ferramenta interessante para introduzir a temática indígena de forma lúdica e educativa, como defendem Brandileone e Valente (2018) em relação à inclusão de obras literárias que contemplem narrativas indígenas, permitindo que as crianças desenvolvam empatia e respeito às culturas indígenas desde cedo.
Por fim, a formação contínua de professores é crucial. Programas de capacitação que incluam estudos sobre a história, cultura e direitos dos povos indígenas podem preparar melhor os educadores para lidar com a diversidade cultural em sala de aula. Essa formação deve ser acompanhada por políticas públicas que garantam recursos e apoio para a implementação efetiva de práticas pedagógicas interculturais.
A decolonialidade é um conceito emergente que busca reverter o legado colonial que persiste nas instituições educacionais, promovendo uma educação que respeite e integre as diversas culturas e saberes dos povos historicamente subjugados. Walsh (2020) argumenta que a decolonialidade na educação envolve a valorização das vozes e perspectivas marginalizadas, promovendo uma pedagogia que seja inclusiva e equitativa. Ela enfatiza a importância de questionar os currículos eurocêntricos e de criar espaços educacionais onde diferentes epistemologias possam coexistir.
A implementação de uma educação decolonial é crucial para promover a justiça social e a equidade nas escolas. Ao desafiar as narrativas dominantes, a decolonialidade permite que estudantes de diversas origens culturais vejam suas histórias e conhecimentos refletidos no currículo escolar. Isso não apenas enriquece o ambiente de aprendizagem, mas também fortalece a identidade cultural dos alunos, promovendo um senso de pertencimento e respeito mútuo.
Walsh (2020) defende que a educação decolonial deve preparar os alunos para serem críticos e reflexivos, capazes de questionar as estruturas de poder e opressão. Isso envolve a criação de currículos que sejam culturalmente relevantes e que incentivem os estudantes a se engajarem ativamente com suas comunidades e histórias.
Para preparar os alunos para uma educação decolonial, é necessário um esforço conjunto de professores, gestores e formuladores de políticas educacionais. Isso inclui a formação contínua de professores, que deve incorporar abordagens interculturais e decoloniais, permitindo que educadores se tornem facilitadores de um aprendizado inclusivo e crítico. Além disso, é importante integrar materiais didáticos que reflitam a diversidade cultural e que sejam desenvolvidos em colaboração com comunidades locais. A inclusão de narrativas indígenas e afrodescendentes nos currículos é essencial para promover uma educação que seja verdadeiramente representativa da diversidade cultural.
Os pensamentos de Walsh (2020) ressoam com as contribuições de outros autores latino-americanos, como Aníbal Quijano e Walter Mignolo, que também exploram a decolonialidade como uma resposta ao legado colonial. Aníbal Quijano introduziu o conceito de "colonialidade do poder", que se refere à persistência das hierarquias coloniais nas sociedades contemporâneas (Quijano, 2005). Walter Mignolo, por sua vez, destaca a necessidade de uma "virada decolonial", que desafie as epistemologias dominantes e promova o reconhecimento dos saberes locais (Mignolo, 2011).
No contexto brasileiro, autores como José Jorge de Carvalho e Boaventura de Sousa Santos discutem a importância de uma educação que seja sensível às realidades culturais e sociais dos povos indígenas e afrodescendentes, promovendo uma pedagogia que seja verdadeiramente intercultural e decolonial (Carvalho, 2019; De Sousa Santos, 2019), como uma oportunidade de reimaginar e transformar as práticas educacionais, promovendo uma pedagogia que seja inclusiva, crítica e culturalmente relevante.
A relação entre os conceitos de decolonialidade, interculturalidade, educação étnico-racial e educação indígena reflete interseções entre cultura, poder e educação. Walsh (2020) propõe que a interculturalidade crítica é um projeto político, social, ético e epistêmico que visa transformar as estruturas, instituições e relações sociais, criando condições de estar, ser, pensar, conhecer, aprender, sentir e viver diferentes. Enfatiza que a interculturalidade, quando vista através da lente da decolonialidade, não se limita ao reconhecimento ou inclusão de diversidades culturais no sistema existente. Em vez disso, ela busca transformar esse sistema, desafiando as estruturas coloniais de poder que persistem na sociedade e na educação.
A educação étnico-racial, no contexto da decolonialidade, busca desconstruir narrativas eurocêntricas e valorizar as contribuições e perspectivas de grupos historicamente marginalizados. Nilma Lino Gomes, pesquisadora brasileira, argumenta que a educação étnico-racial deve ser entendida como um processo de descolonização do currículo e das práticas pedagógicas (Gomes, 2012) e destaca que essa abordagem não se limita à inclusão de conteúdos sobre a história e cultura afro-brasileira e indígena, mas envolve uma mudança profunda na forma como o conhecimento é construído e transmitido nas escolas.
A educação indígena, quando vista através das lentes da interculturalidade e da decolonialidade, busca não apenas preservar as culturas indígenas, mas também promover um diálogo equitativo entre diferentes formas de conhecimento. Gersem Baniwa (2013), educador e pesquisador indígena brasileiro, argumenta que a educação indígena deve ser baseada em princípios de autonomia, autodeterminação e valorização dos conhecimentos tradicionais. Baniwa (2013) enfatiza que a educação indígena intercultural não deve ser vista como uma forma de integração à sociedade dominante, mas como um meio de fortalecimento das identidades e culturas indígenas, ao mesmo tempo em que promove o diálogo com outros saberes.
Candau (2008), sintetiza bem essa relação ao argumentar que uma educação verdadeiramente intercultural e decolonial deve "promover uma educação para o reconhecimento do 'outro', para o diálogo entre os diferentes grupos sociais e culturais" (p. 52). Esses conceitos formam um quadro teórico e prático para repensar a educação de uma maneira que desafie as hierarquias coloniais, valorize a diversidade cultural e promova a justiça social. Eles oferecem caminhos para uma educação que seja verdadeiramente inclusiva, equitativa e transformadora.
Assim, como práticas pedagógicas de intervenção a serem trabalhadas com os estudantes, se propôs o desdobramento em um projeto dividido em 7 partes: 1. Pesquisa e apresentação; 2. Contação de histórias indígenas; 3. Visita virtual a uma aldeia indígena; 4. Arte indígena; 5. Dia da culinária indígena; 6. Debates e reflexões; e 7. Jogo de tabuleiro.
Na primeira parte, denominada pesquisa e apresentação, dividimos os estudantes em grupos e propomos a cada um que pesquisasse sobre uma etnia indígena específica dentre os 305 presentes de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística[1] , para que possam aprender sobre suas histórias, culturas, tradições, língua, costumes e localização geográfica. Cada grupo pode preparou uma apresentação, utilizado o Microsoft® PowerPoint, que é um dos módulos do curso de qualificação deste curso de Informática deste Centro Municipal de Capacitação e Treinamento, para compartilhar as informações com a turma.
A segunda parte, denominada “contação de histórias indígenas”, coube ao corpo docente e gestão escolar, convidar um contador de histórias indígenas para visitar a escola ou utilizar recursos audiovisuais para compartilhar histórias tradicionais transmitidas oralmente pelas comunidades indígenas. Devido a falta de recursos financeiros, optou-se pela segunda opção. Em seguida, os estudantes foram convidados a escrever e ilustrar suas versões das histórias com as narrativas. Tal proposta também foi produzida utilizando o Canva®, plataforma online de criação audiovisual que também faz parte deste curso de qualificação profissional.
Como terceira parte, a “visita virtual a uma aldeia indígena”, entramos em contato com uma aldeia indígena local (a Aldeia Indígena Multiétnica Filhos da Terra, que fica na cidade de Guarulhos-SP, a 40km de distância) para organizar uma visita para que os estudantes pudessem ter a oportunidade de conhecer o dia a dia, as atividades, as tradições e as manifestações culturais desses povos. Também devido a falta de recursos financeiros, realizamos um tour virtual à Aldeia Tekoa Itakupe, localizada no bairro do Jaraguá na cidade de São Paulo. A visita é livre, realizada através de um portal patrocinado pela Secretaria da Cultura da Cidade de São Paulo e que pode ser acessado em https://www.aldeia360.art.br/.
• A quarta, que chamamos de “arte indígena”, levou-nos a explorar diferentes formas de arte indígena, como pintura corporal, cerâmica, cestaria e arte plumária. Os estudantes pesquisaram sobre essas manifestações artísticas, aprenderam sobre seus significados e técnicas e criaram suas próprias obras de arte inspiradas nelas utilizando o software Paint®, que também faz parte do curso de qualificação.
• No dia da culinária indígena, quinta parte, tínhamos como proposta, já que a unidade escolar também conta com cursos de qualificação em Confeitaria e Panificação, realizarmos um dia dedicado à culinária indígena, onde os estudantes da turma de informática e dos cursos supracitados pudessem pesquisar receitas tradicionais indígenas, preparar os pratos na sala de aula e compartilhar a experiência com toda a comunidade escolar. Trataria de uma oportunidade para aprender sobre a alimentação indígena e valorizar a diversidade culinária presente nas diferentes etnias e que hoje também faz parte da nossa dieta, como a tapioca, pipoca e fubá. Porém, por dificuldades logísticas este dia não foi possível porém a partir da análise das receitas presentes no curso de Confeitaria e no curso de Panificação do CMCT, os estudantes de Informática puderam criar um quadro, utilizando o software Excel® em conjunto com um navegador de internet, que apresentasse o nome do ingrediente proveniente da culinária indígena e o seu significado.
• Os debates e reflexões, quinta parte desta proposta, foi o momento que promovemos discussões e rodas de conversa em sala de aula sobre questões atuais que envolvem os povos indígenas, como a preservação ambiental, a demarcação de terras e o Marco Temporal[2] e o respeito aos direitos indígenas para que não se repitam casos como a tragédia Yanomami, publicizada na mídia nacional no início de 2023[3]
• Por fim, a sétima e última etapa consistiu na criação de um jogo de tabuleiro, No estilo board game, onde os alunos puderam, a partir da releitura do texto que trouxe à tona toda essa problemática, criar um jogo de cartas utilizando os “10 erros comuns sobre as culturas indígenas no Brasil”, disponível em https://ensinarhistoria.com.br/10-erros-comuns-nas-aulas-de-cultura-indigena, para, de forma lúdica, potencializarem o processo de ensino-aprendizagem com seus pares. Exemplares de algumas cartas estão reproduzidos nas figuras 1 e figura 2.
Figura 1
Modelo de verso das cartas
Figura 2
Conteúdo de uma das cartas
A implementação de intervenções pedagógicas que promovem a interculturalidade e a decolonialidade nas escolas é um passo crucial para transformar ambientes educacionais etnocêntricos em espaços de respeito e valorização das diferenças. Catherine Walsh destaca a importância da decolonialidade como uma abordagem crítica que desafia as estruturas coloniais ainda presentes na educação, onde argumenta que a decolonialidade busca não apenas incluir perspectivas marginalizadas, mas transformar fundamentalmente o sistema educacional para que ele reflita e respeite a diversidade cultural (Walsh, 2020).
Em uma intervenção pedagógica, isso significa revisar currículos, práticas pedagógicas e políticas escolares para que integrem e valorizem os saberes indígenas e afro-brasileiros. A interculturalidade, como proposta por Walsh e outros, nos ajuda enquanto educadores a promover o diálogo e a compreensão entre diferentes grupos culturais. Backes (2018), por exemplo, enfatiza a construção de currículos interculturais que respeitem e valorizem a autonomia cultural dos povos indígenas e, em uma intervenção pedagógica, isso pode se traduzir em atividades que promovam o intercâmbio cultural e o respeito mútuo, envolvendo não apenas os alunos, mas também todos aqueles que participam direta e indiretamente do cotidiano escolar.
Gomes (2012) contribui para o debate ao destacar a importância da educação étnico-racial como um processo de descolonização do currículo como essencial para desconstruir narrativas eurocêntricas e valorizar as contribuições de grupos historicamente marginalizados ao que isso, em uma intervenção pedagógica, pode incluir a organização de eventos que celebrem a diversidade cultural e promovam o respeito e a empatia entre os participantes.
Para que uma intervenção pedagógica seja eficaz, é essencial envolver a comunidade local e as famílias dos alunos. Baniwa (2013) defende uma educação que promova o diálogo intercultural e fortaleça as identidades culturais que, ao envolver a comunidade, as escolas podem se tornar centros de transformação social, onde o conhecimento e o diálogo são usados para combater preconceitos e promover uma sociedade mais justa e inclusiva.
[1] Disponível em https://indigenas.ibge.gov.br/
[2] Marco Temporal, segundo expressa o site da Câmara dos Deputados do Brasil, é “uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição”. Disponível em https://www.camara.leg.br/noticias/966618-o-que-e-marco-temporal-e-quais-os-argumentos-favoraveis-e-contrarios/
[3] Matéria disponível no site da da Câmara dos Deputados do Brasil: https://www.camara.leg.br/tv/935635-tragedia-humanitaria-dos-yanomami/
Resultados
Tínhamos como hipótese que, com o passar do tempo, as atitudes dos alunos começassem a mudar em seus comportamentos e condutas outrora internalizadas. Que passassem a compreender e respeitar a riqueza cultural dos povos indígenas, a valorizar suas contribuições para a nossa sociedade, e “reconhecer o indígena como um dos pilares da formação da sociedade brasileira, como protagonista da sua história no mundo contemporâneo" (Ângelo, 2019).
Entretanto, embora durante as atividades neste curso de qualificação em Informática pudéssemos perceber uma ligeira mudança de conduta entre os estudantes, o CMCT é uma unidade escolar com turmas bimestrais, ou seja, estas sete partes em que a intervenção foi dividida preencheram praticamente todos os 2 meses de aulas o que recomendamos em próximas pesquisas estudos longitudinais que possam acompanhar estes estudantes em outros cursos e até mesmo no mercado de trabalho, visto que o objetivo desta unidade escolar é o de preparar jovens e adultos para o mercado de trabalho.
Percebemos que o trabalho é contínuo e deve-se ainda envolver suas famílias e a comunidade local, onde há muito berço de estigmas e criação de preconceitos, promovendo eventos que destaquem a importância de respeitar e valorizar a interculturalidade. Espera-se que essa unidade escolar se torne um espaço acolhedor, onde o respeito, a empatia e a valorização das diferenças sejam respeitadas e que os alunos e comunidade, agora conscientes do seu papel na construção de uma sociedade mais justa, passem a defender os direitos dos povos indígenas e a combater qualquer forma de preconceito. Acreditamos que intervenções pedagógicas como essa mostram como a atuação de educadores comprometidos com a interculturalidade pode transformar uma escola etnocêntrica em um ambiente de respeito e valorização das diferenças.
A intervenção pedagógica realizada no Centro Municipal de Capacitação e Treinamento (CMCT) apresentou resultados interessantes, considerando tanto os avanços observados quanto as limitações temporais do estudo.
Durante o período de intervenção, foram observadas mudanças sutis, porém significativas, no comportamento dos alunos em relação à temática indígena. Estas transformações, ainda que iniciais, indicam um processo de desconstrução de preconceitos e estereótipos, alinhando-se com o que Walsh (2020) define como um dos objetivos fundamentais da educação intercultural: a transformação das estruturas de pensamento colonial ainda presentes em nossa sociedade.
Um fator crucial que impactou os resultados foi a estrutura bimestral do curso de qualificação em Informática. Como observa Candau (2012), processos de transformação cultural e desconstrução de preconceitos requerem tempo e continuidade. O período de dois meses, embora tenha permitido a implementação das sete etapas planejadas, apresentou-se como um intervalo relativamente curto para a consolidação de mudanças mais profundas.
Com base nos resultados obtidos, emerge a necessidade de estudos longitudinais que possam acompanhar os estudantes em sua trajetória posterior, avaliar o impacto das intervenções no médio e longo prazo e observar a aplicação prática dos conhecimentos adquiridos no mercado de trabalho.
A necessidade de estudos longitudinais no contexto da educação intercultural e decolonial se faz necessária para compreender a efetividade e o impacto duradouro das intervenções pedagógicas. Esta proposição fundamenta-se em evidências científicas e teóricas que demonstram a complexidade das transformações culturais e comportamentais no ambiente educacional.
Walsh (2020) argumenta que as transformações decoloniais não são processos instantâneos, mas sim transformações graduais que requerem tempo para se consolidarem. A autora enfatiza que "a decolonialidade é um processo contínuo de desaprendizagem e reaprendizagem que necessita ser observado e analisado ao longo do tempo para compreender seus verdadeiros impactos" (Walsh, 2020, p. 45). Candau (2012) corrobora esta perspectiva ao afirmar que as mudanças nas concepções culturais e nas práticas sociais são processos que demandam acompanhamento prolongado. Segundo a autora, "as transformações nas relações interculturais necessitam de tempo para se consolidarem e se manifestarem em diferentes contextos sociais, incluindo o ambiente profissional" (Candau, 2012, p. 89).
Gomes (2019) demonstra em suas pesquisas que o impacto da educação étnico-racial frequentemente se manifesta em momentos posteriores da vida dos educandos, quando estes se deparam com situações práticas que demandam posicionamento crítico. Estudos longitudinais permitiriam observar como os conhecimentos adquiridos são mobilizados em diferentes contextos e momentos da vida dos estudantes. Para Santos (2019), as transformações epistemológicas necessárias para uma verdadeira educação decolonial requerem tempo para se consolidarem e produzirem mudanças efetivas nas práticas sociais, corroborando que o acompanhamento longitudinal possibilitaria avaliar como as intervenções pedagógicas influenciam as escolhas, atitudes e comportamentos dos estudantes ao longo do tempo.
Carvalho (2019) destaca que a verdadeira efetividade da educação intercultural se manifesta na capacidade dos indivíduos de promoverem transformações em seus ambientes profissionais. O acompanhamento dos egressos permitiria compreender como os conhecimentos interculturais são aplicados em situações práticas do mercado de trabalho. Estudos recentes demonstram a eficácia do acompanhamento longitudinal em intervenções educacionais. Por exemplo, a pesquisa de Baniwa (2013) com estudantes indígenas demonstrou que as transformações mais significativas nas relações interculturais foram observadas anos após as intervenções iniciais, quando os estudantes já estavam inseridos em diferentes contextos sociais e profissionais.
Entretanto, para implementar estudos longitudinais efetivos, seria necessário desenvolver instrumentos de acompanhamento sistemático, além de estabelecer parcerias com instituições empregadoras com a criação de mecanismos de feedback contínuo e a implementação de sistemas de avaliação periódica
Esta recomendação encontra respaldo nas considerações de Baniwa (2013), que enfatiza a importância de uma educação intercultural que transcenda os limites da sala de aula e se integre às práticas sociais e profissionais dos educandos.
Embora as mudanças observadas tenham sido graduais, houve progresso significativo em direção ao objetivo de fazer os alunos "reconhecerem o indígena como um dos pilares da formação da sociedade brasileira, como protagonista da sua história no mundo contemporâneo" (Ângelo, 2019). Este resultado dialoga com as proposições Gomes (2012) sobre a importância da educação étnico-racial na desconstrução de narrativas eurocêntricas.
A divisão da intervenção em sete partes mostrou-se uma estratégia adequada para a organização e implementação das atividades, permitindo uma abordagem sistemática e progressiva dos conteúdos. No entanto, como aponta Backes (2018), a construção de currículos interculturais é um processo contínuo que demanda adaptações e aperfeiçoamentos constantes.
Discussão e conclusões
Este trabalho apresentou uma intervenção pedagógica realizada no Centro Municipal de Capacitação e Treinamento Professor Lenine Soares de Jesus, uma unidade escolar pública localizada na região do Itaim Paulista, zona leste da cidade de São Paulo. A intervenção teve como objetivo principal diminuir etnocentrismos e preconceitos étnicos por meio da educação da cultura indígena, promovendo a valorização da diversidade, em conformidade com a Lei nº 11.645/2008.
A proposta metodológica foi desenvolvida em sete etapas distintas e complementares: pesquisa e apresentação; contação de histórias indígenas; visita virtual a uma aldeia indígena; arte indígena; dia da culinária indígena; debates e reflexões; e criação de um jogo de tabuleiro. Essa estruturação permitiu uma abordagem sistemática e progressiva dos conteúdos, facilitando a assimilação e o engajamento dos estudantes com a temática.
Em relação aos objetivos específicos inicialmente propostos, observamos resultados significativos, ainda que graduais. O primeiro objetivo, que visava a desconstrução de estereótipos e preconceitos sobre os povos indígenas, foi parcialmente alcançado, evidenciado pelas mudanças sutis, mas perceptíveis, nas atitudes e discursos dos estudantes ao longo do bimestre. O segundo objetivo, relacionado à promoção do reconhecimento e valorização das contribuições indígenas para a sociedade brasileira, também apresentou avanços, principalmente através das atividades práticas e discussões em sala de aula.
No entanto, a limitação temporal do curso, restrito a um período bimestral, apresentou-se como um desafio significativo para a consolidação mais profunda dessas transformações. Esta constatação nos leva a refletir sobre a necessidade de intervenções mais prolongadas e contínuas, que possam acompanhar o desenvolvimento dos estudantes ao longo de sua trajetória educacional e profissional.
Um aspecto particularmente relevante observado durante a intervenção foi o potencial transformador das atividades práticas e interativas, como a criação do jogo de tabuleiro e as discussões sobre questões contemporâneas que afetam os povos indígenas. Estas atividades não apenas engajaram os estudantes de maneira mais efetiva, mas também proporcionaram oportunidades concretas para a aplicação dos conhecimentos adquiridos e o desenvolvimento de um pensamento crítico sobre a temática.
A experiência também evidenciou a importância crucial do envolvimento da comunidade escolar como um todo no processo de transformação cultural. Percebemos que as mudanças mais significativas ocorrem quando há um esforço coletivo e coordenado, que ultrapassa os limites da sala de aula e alcança as famílias e a comunidade local.
Para trabalhos futuros, identificamos algumas lacunas importantes que merecem investigação mais aprofundada. Primeiramente, há necessidade de estudos longitudinais que possam acompanhar o impacto dessas intervenções pedagógicas no médio e longo prazo, especialmente no contexto profissional dos egressos. Também seria valioso explorar como diferentes abordagens metodológicas podem ser adaptadas para cursos de curta duração, maximizando seu impacto no limitado tempo disponível.
Outra área que merece atenção é o desenvolvimento de estratégias específicas para envolver mais efetivamente as famílias e a comunidade local nas discussões sobre diversidade cultural e respeito aos povos indígenas. Além disso, seria interessante investigar como as tecnologias digitais podem ser melhor aproveitadas para promover o diálogo intercultural e a compreensão mútua entre diferentes grupos culturais.
Por fim, concluímos que, apesar dos desafios encontrados, esta intervenção pedagógica demonstrou-se necessária, importante e eficaz para promover a conscientização e o respeito à diversidade cultural. As mudanças observadas, ainda que graduais, indicam um caminho promissor para a construção de uma educação mais inclusiva e equitativa, que reconheça e valorize a riqueza das contribuições indígenas para nossa sociedade. O trabalho realizado reforça a importância de continuarmos desenvolvendo e aprimorando estratégias educacionais que promovam a interculturalidade e o respeito mútuo em nossos espaços educacionais.
Referências
Ângelo, F. N. P. (2019) Os dez anos da Lei n° 11.645/2008: avanços e desafios. Caderno Cedes, 39, 357-378. https://www.scielo.br/j/ccedes/a/yrXGvcNFhs5JLcjJv9Nx5bG/
Backes, J. L. (2019). A luta política para a construção de currículos interculturais e decoloniais pelos indígenas. Currículo sem Fronteiras, 19(3), 1115-1130. http://dx.doi.org/10.35786/1645-1384.v19.n3.18
BANIWA, G. (2013). Educação escolar indígena no Brasil: avanços, limites e novas perspectivas. Reunião Nacional da ANPED, 36, 3-18. http://36reuniao.anped.org.br/pdfs_trabalhos_encomendados/gt21_trabalhoencomendado_gersem.pdf
Brandileone, A. P. F. N., & Valente, T. A.. (2018). Literatura indígena para crianças: o desafio da interculturalidade. Estudos De Literatura Brasileira Contemporânea, (53), 199–217. https://doi.org/10.1590/2316-4018538
Brasil. (2008). Presidência da Repúbica. Lei nº 11.645, de 10 de março de 2008. Brasília, DF.
Brasil. (2003). Presidência da Repúbica. Lei nº 10.639, de 09 de janeiro de 2003. Brasília, DF.
Brasil. (2018). Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular: Ensino Fundamental. Brasília. http://basenacionalcomum.mec.gov.br/
Candau, V. M.. (2008). Direitos humanos, educação e interculturalidade: as tensões entre igualdade e diferença. Revista Brasileira De Educação, 13(37), 45–56. https://doi.org/10.1590/S1413-24782008000100005
Candau, V. M. F. & Russo, K. (2010). Interculturalidade e educação na América Latina: uma construção plural, original e complexa. Revista Diálogo Educacional, 10(29), 151-169. http://educa.fcc.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1981-416x2010000100009&lng=pt&tlng=.
CANDAU, V. M. (2012). Didática crítica intercultural: aproximações. Petrópolis, RJ: Vozes, 107-138.
Carvalho, J. J. D. (2019). Encontro de Saberes e descolonização: para uma refundação étnica, racial e epistêmica das universidades brasileiras. Em: Bernardino-Costa, J. et al. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico, Autêntica. 2ª ed. 79-106.
Coelho, W. de N. B., & Soares, N. J. B. (2016). A Implementação das Leis Nº 10.639/2003 e Nº 11.645/2008 e o Impacto na Formação de Professores. Educação Em Foco, 21(3), 573–606. https://doi.org/10.22195/2447-524620162119871
Teixeira de Menezes, A. L., de Moura, O. I., & Graeff Wernz, M. C. (2020). Encontros interculturais entre um indígena Kaingang e não indígenas: enlaces em um pensar perspectivista e sincrônico. Tellus, 20(41). https://doi.org/10.20435/tellus.v20i41.665
Faustino, R. C. et al., (2022). A interculturalidade na educação escolar indígena. Teoria e prática da educação, 25(1), 174-189. https://doi.org/10.4025/tpe.v25i1.57813
Gomes, N. L. (2012). Relações étnico-raciais, educação e descolonização dos currículos. Currículo sem fronteiras, 12(1), 98-109. https://www.academia.edu/download/82020822/gomes.pdf
Gomes, N. L. (2019). O movimento negro educador: saberes construídos nas lutas por emancipação. Editora Vozes Limitada.
Gonçallo, R. L. et al., (2019). Interculturalidade e Educação: abordando a Temática Indígena na Educação Básica. Revista Vértices, 21(1), 18-27. https://doi.org/10.19180/1809-2667.v21n12019p18-27
Melo, C. J. R. e Senhoras, E. M. (2022). Currículo: Interculturalidade & Inclusão. Editora IOLE. p. 267. https://doi.org/10.5281/zenodo.7150192
Mignolo, W. (2011). The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press.
Quijano, A. (2005). Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. Em: Lander, E. (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Buenos Aires: CLACSO. 107-126.
De Sousa Santos, B. (2019). O fim do império cognitivo: a afirmação das epistemologias do Sul. Autêntica.
São Paulo (Município). Secretaria Municipal de Educação. Coordenadoria Pedagógica. Currículo da cidade: povos indígenas: orientações pedagógicas. São Paulo: SME/COPED, 2019.
Walsh, C. E. (2020). Decolonial learnings, askings and musings. Postcolonial Studies, 23(4), 604–611. https://doi.org/10.1080/13688790.2020.1751437